30 de março de 2009

Modernidades de Assustar (Parte I)

Coisas legais entre outras não tão legais, algumas piadas e as refilmagens, como sempre, da indústria moderna. Tem coisas que são imperdoáveis, como saber que estão refilmando Let The Right One In (do qual pretendo falar em outro século provavelmente), filme batido com os melhores ingredientes e servido em prato de porcelana, a melhor obra não só do gênero como da sétima arte que tenho visto nos últimos 5 anos.

Não é brincadeira, o gênero não andou trazendo coisa legal, a produção independente cresce, na França e Inglaterra principalmente, mas coisa boa tá em falta. Coisa sangrenta tem, bastante, mas tem gente que esquece que não é só de gosma e corante que se faz um bom filme.

Quando o texto é bom, temos algumas surpresas: O caso de Midnight Meat Train, baseado em um conto de Clive Barker, tem belíssimas cenas de assassinato, e consegue prender bem. As marteladas são impactantes, a maioria das cenas dentro do metrô são bem legais, mas como é de se esperar em um texto de Barker, o link entre o oculto e o homem-cego-moderno (que irônicamente é, no filme, um personagem fotógrafo que busca a alma da cidade através do olhar) acaba estragando no final boa parte do que poderia ter sido poupado dos olhos e do conhecimento do espectador. Mas o filme tem um charme inesperado, que só um texto bem escolhido de Barker poderia trazer. Se você conseguir esquecer os últimos minutos de filme, vai relembrar este aqui como uma boa experiência.


Isso não passava no National Geographic, querida

Também baseado em literatura, The Ruins traz a direção de Carter Smith, vencedor de alguns prêmios com seu curta “Bugcrush”. Resultado: Um bom filme, mas pouco ousado em comparação ao cartão de visitas do diretor. O curta consegue ser moderno, com um clima de indie flick focado nos personagens bissexuais, e um tanto minimalista, o que compactua com o geral. A história se desenvolve misteriosamente em torno do que poderia ser apenas um caso de violência ou bullying entre jovens na escola, se não fosse pelo fator surreal quanto à química de um inseto utilizado para diversão como uma droga qualquer. Tanto o aspecto biológico (Em Bugcrush, temos um inseto que produz droga, em The Ruins, plantas carnívoras vorazes) quanto a própria forma de lidar com o universo dos jovens americanos indicou naturalmente Carter Smith para a direção de The Ruins, o que provou ser legal, mas não tanto quanto poderia. A criatividade encontrada em Bugcrush deve ter sido controlada em uma produção maior, o que de qualquer forma não atrapalhou muito o resultado, apesar do que eu preferiria ver Cronenberg filmando as plantinhas famintas (mas em defesa de Carter, como Cronenberg mesmo diria, Long Live the New Flesh).


Late que eu tô passando vai, late

Entre as modernidades interessantes, me esforcei para baixar o filme do filho de Roy Liechtenstein, cujas obras inspiradas por quadrinhos agradam a tantos e, não minto, são das melhores que vieram com a Pop Art. O que esperar de um filme chamado Teeth, sobre uma mulher que tem uma vagina mordedora, cujo trailer ressalta “esta rosa tem espinhos”? Algo bom, claro! Pelo menos eu pensei que, se bem conduzido, dava pra rolar, eu confio no gênero. O roteiro foi desenvolvido a partir de uma lenda antiga que servia para desencorajar a sexualidade precoce, pregando a castidade antes do casamento em culturas tribais - a lenda da Vagina Dentata. E de início, o filme começa bem! Vai tudo indo muito bem, a direção lubrifica legal, mas aí, de repente, a gente leva uma mordida... O filme mostra como a personagem (uma santinha que prega a castidade em algo tipo um grupo evangélico) se apaixona e vai mudando sua cabeça visto que seus hormônios estão saltitando, e acaba descobrindo sua peculiaridade genital da pior forma (leia-se aqui, com uma das melhores cenas do filme). O que ia sendo levado de forma sutil, acaba virando piada. O medo do diretor é aqui escancarado: temendo os comentários e as críticas quanto a um drama assustador focado na vagina que morde, ele prefere transformar o filme, de uma hora pra outra (leia-se, durante uma ida ao ginecologista) em uma grande piada com piercing na glande e velhos com língua ferina. Nem preciso dizer que o doutor perde os dedos. Maldito diretor medroso. Mas como dizem por aí, quem tem cu tem medo (ou quem tem pica).

Enfim, isso é pra mostrar que a melhor produção do gênero ainda se apóia na boa e velha literatura, a fonte original do nascimento do verdadeiro Horror pós-narrativas-folclóricas-ao-redor-da-fogueira. Let The Right One In, que citei lá em cima, também veio inicialmente das páginas de um livro.

Mas só porque eu to lembrando disso aqui no blog, não me venham falar de Crepúsculo, que aqui a gente não lida com Harry Potter.

Saul Mendez para o Gore Bahia 30/03/2009

Um comentário:

João Daniel disse...

Que bom que o seu blog ressucitou!Mas não vou ler nada agora, senti o cheiro de spoilers no ar, kkkk

Quando eu conseguir assistir The Ruins, My Blood Valentine, Let the Right One In etc..., tipo daqui a seis meses, eu volto aqui, leio e comento, kkkk

"Não é um celular...SÃO AS PLANTAS!!!!"

Smith ídolo!